Eternizar o instante.
Ainda adolescente, assisti a um filme produzido na antiga União Soviética. O enredo contava a história de um rapaz destacado para o front na II Guerra Mundial.
Depois de dois anos longe, o jovem finalmente ganhou um salvo conduto de quinze dias para voltar para casa. Gastaria o tempo com a mãe. A viagem de regresso, contudo, foi cheia de percalços.
O trem quebrou. Aconteceu um ataque de tropas inimigas. Nevou. Os incidentes se multiplicaram. Depois de inúmeros atrasos, ao desembarcar na estação do vilarejo, o soldado só dispunha de alguns poucos minutos antes de pegar o trem que lhe devolveria às tropas. Se falhasse, enfrentaria processo como desertor.
O inominável se deu com a mãe: ela também se atrasou. Os raros minutos do rapaz foram desperdiçados a andar, desesperado, de um lado para outro. O tempo se esgotou. Ele se viu obrigado a subir de volta ao mesmo vagão. Mas eis que, no exato momento em que o trem começou a se afastar, a mãe chega. A dramaticidade da trama atinge o ponto máximo quando a mulher corre atrás do trem. Com a locomotiva em movimento, filho e mãe mal conseguem tocar a ponta dos dedos.
Todo o esforço da viagem se resumiu ao simples toque de dedos e uma mera troca de olhares. Na última cena, o vagão desaparece numa curva enquanto o filho se recosta, aliviado, em um assento de madeira. Ele parece feliz, com um leve sorriso nos lábios. O filme deixa uma mensagem: quando amamos, qualquer encontro, mesmo fluido, rápido ou impermanente se torna precioso.
Na vida, contamos com duas dimensões: passado e futuro. O passado, que se alonga como sombra, e o futuro, que encolhe. Nunca possuímos o presente. O instante foge. O presente escapa. O momento se esfumaça. A vida se dilui velozmente. A única constância que existe é o devir, que transforma, sem parar, futuro em passado. Essa fluidez ninguém impede.
No hiato fugaz entre o porvir e o passado, alguns acontecimentos se perdem, outros se eternizam. Com o passar dos anos nossa memória vai se tornando seletiva. De tudo o que vivenciamos, apenas um punhado de eventos fica armazenado – alguns doloridos, outros felizes.
Sempre que conseguimos armazenar na lembrança um acontecimento, eternizamos aquele instante. Permanecem na gente tanto as recordações boas como as ruins. Carregamos em algum recôndito da alma, cicatrizes, traumas, olhares ferinos, frases destruidoras, gestos ameaçadores. Também mantemos, como um flash agradável, incentivos, abraços solidários, acolhimentos, sorrisos.