Pesquisar este blog

quinta-feira, 11 de outubro de 2012



A Pedra e o Anjo

Quero compartilhar com vocês uma pequena história que ouvi, pelos caminhos da vida. Não sei por que, mas senti uma vontade imensa de fazer isso agora. Coisas do coração.
Conta-se uma história interessante sobre Michelangelo. 
Dizem que o mestre do renascimento italiano andava pela cidade de Roma, seguido por alguns alunos. Ao passar por um escombro, parou e lhes disse: – Vejam! Ali se encontra um anjo! Os discípulos perplexos por nada verem, perguntaram ao mestre onde ele estava vendo o anjo. Michelangelo respondeu, dizendo: — Vejo-o aprisionado naquele pedaço de mármore jogado fora. Basta tirar da pedra o excesso que o anjo aparece.

Entusiasmados com a ideia, os discípulos o ajudaram a levar a pedra para o ateliê e o viram trabalhando intensamente por alguns dias. Ao final, lá estava o anjo. Se a história é verdadeira ou não, pouco importa. O que importa é a lição que ela nos traz – de fato a beleza se esconde. Para tê-la é necessário o exercício da arte, e arte é o que sustenta a educação, a pintura, a escultura, as relações pessoais; enfim, a vida. Transformar tudo em arte, esse é o grande projeto dos relacionamentos humanos.

Fazer da vida algo belo é o desafio maior. Criar a beleza é fruto da sabedoria. E viu Deus que isso era bom, já nos ensinam as Escrituras sobre o ato criador. Trazer a beleza para fora, expô-la, nos faz seres encantados. Transformar a vida em arte, no entanto, pressupõe habilidades que a história da Pedra e do Anjo parece nos revelar.

A primeira delas é ter uma mente restauradora. O pensamento que deve nutrir nossas relações, mesmo nos momentos difíceis, é que tudo pode ser reconstruído. Alimentar pensamentos assim nos torna artistas. Muito provavelmente Michelangelo nutria, todo o tempo, uma visão de mundo de que tudo pode ser construído, melhorado, embelezado –uma mente de artista.

Uma pedra jogada fora é algo mais que simplesmente uma pedra jogada fora. Michelangelo era um edificador, alguém capaz de ver anjo em pedra, capaz de tirar beleza de pedaços desprezados. Nem sempre temos a visão de que as coisas podem ser construídas, restauradas, edificadas. Pensamos ser mais fácil abandonar, jogar fora e comprar outro, novo. 

Um aluno difícil, estigmatizado por colegas e professores, torna-se uma pedra jogada fora. Um relacionamento caracterizado por amarguras torna os atores pedras desprezadas. Uma emoção mal conduzida inviabiliza várias oportunidades. Muitas vezes, diante de situações como essas, o que fazemos, no máximo, é colocá-las no escombro. É mais fácil abandonar algo que incomoda do que reconstruí-lo. Essa visão imediatista do mundo tira de nós a competência restauradora.

A segunda habilidade, ter visão de futuro. A incapacidade de ver o futuro torna nossas decisões expressões da ansiedade; faz de nossas opções um grandioso apelo ao aqui e agora; tira de nós a perspectiva do inefável. O anjo esculpido por Michelangelo preservou a pedra que estava no lixo.

A visão de futuro nos capacita a ter esperanças. Os olhos do futuro são menos imediatistas que os olhos do presente – nos fazem ver possibilidades que agora aparecem apenas como pedra tosca jogada no lixo. Ver o futuro é sonhar com a possibilidade. A própria natureza humana nos ensina isso. Quando vejo uma mulher grávida, sempre penso – ali vai um extraordinário grito da esperança. Engravidar é ter visão de futuro, é construir a esperança.

Pensar em nossos atos como construções de futuro imprime outro significado às coisas. Corrigir um filho orientar um aluno, fazer uma promessa, declarar um amor, plantar uma nogueira, são atos capazes de configurar diversos futuros, conforme a natureza de nossa visão ou de nossos sonhos. Pensar em nós mesmos como construtores de futuro é elevar a vida ao mais alto padrão estabelecido por Deus. É ser capaz de enxergar o que não se vê.

A terceira é a necessidade de conhecimento e estudo. Michelangelo estava preparado para esculpir, conhecia a técnica, exercitava-se nela. Quanto mais estudo, mais competência. A criação surge sempre de uma mente preparada.
As oportunidades pousam em mentes abertas. A ideia de que algo possa acontecer sem preparação é infantil e pouco prática. Na melhor das hipóteses, gera uma enorme frustração quando descobrimos que não percebemos as oportunidades porque não tínhamos distinções capazes de vê-las. Nos dias de hoje, a quantidade de informação disponível e a dinâmica das relações fazem com que as possibilidades estejam presentes a todo tempo.

Vê-las é um exercício da capacidade, da sensibilidade e de inspiração. No entanto, essas coisas não são fruto de processos misteriosos, são, isso sim, resultados de muita dedicação e aprendizagem. Existe por aí um universo a ser descoberto, muitos anjos a serem libertos, muitas pedras a esculpir. Mas, uma das coisas que se requer para tal façanha é estarmos preparados para enfrentar as pedras e transformá-las em arte. Isso é fruto de trabalho, conhecimento e técnica.

Nenhum comentário:

Postar um comentário